Iniciamos o texto com o relato da notícia jurídica de caso sobre jovem com hipóxia isquêmica, que teve decisão judicial a seu favor, pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, para que pudesse receber o serviço de home care de modo integral para seu tratamento.
A ênfase inicial era o viés jurídico, que foi se alterando conforme escrevíamos, pela realidade da história; pela força da sua batalha e pelas inevitáveis lágrimas que o caso é capaz de despertar em quem possa ver o mundo com sensibilidade. Então, a narrativa fática adquire o tom do amor que a envoltou, pela incansável e determinante luta da família.
Fomos procurados por uma família que lutava para levar um jovem, de menos de 20 anos para casa, rapaz que foi acometido de modo permanente, com graves e severas sequelas.
Para haver um retrato fidedigno da situação, visitamos o rapaz no hospital de retaguarda, onde se encontrava após sua transferência do nosocômio, em que permaneceu internado por mais de um ano. Estava acompanhado de sua mãe, que tem a sua curatela, mulher guerreira e determinada, que passou longas noites ao lado do seu filho. Chegava a morar no hospital, estando ao lado do jovem, deixando de lado seu trabalho, seu marido e seus outros filhos. Sua dedicação fazia com que seus olhos se enchessem de amor. Seu olhar não carregava tristeza, nem seu andar demonstrava hesitação. Ao contrário. Eram passos firmes de quem sabia a razão de sua batalha.
A mãe do jovem demonstrou confiança no nosso trabalho a todo tempo. Acreditava também como era justa a sua busca. Não sem razão.
O jovem, sua mãe e sua família, foram resistentes a ouvir a negativa administrativa do plano de saúde, insistindo na busca judicial para que pudessem levar o rapaz para tratamento em seio familiar, com toda a assistência de que necessitava: visita de fisiatra semanal; enfermagem; fisioterapia diária; fonoaudiologia semanal, além do fornecimento de medicamentos e insumos.
Adveio êxito na liminar ajuizada por nosso escritório, sendo determinado que o jovem rapaz tivesse a estrutura de home care montada em casa, no prazo de 48 horas.
Tinha chegado a vez de o jovem rapaz retornar para casa. E de sua mãe também. Poderiam carregar nas malas que saíam do hospital não apenas seus pertences que ali se encontravam, mas também a sensação da primeira vitória, após tanta dor e tanta luta.
Como advogados, transcendemos a barreira da linguagem legal. Nos comunicamos com humanidade, sem deixar a razão de lado; falamos com o coração, sem deixar de lutar pelo justo.
E assim foi o caso desse jovem, acompanhado por sua família que o soube amar numa situação de adversidade. Soube persistir.
Poderíamos, reiteradamente, descrever a súmula 90 do Tribunal de Justiça de São Paulo, que, preceitua que “havendo expressa indicação médica para a utilização dos serviços de home care, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não
pode prevalecer“. Ou pontuar que, de tão abusiva que foi a negativa do plano de saúde, houve inclusive o arbitramento de danos morais de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além da determinação da prestação integral do serviço de home care ao jovem rapaz.
Poderíamos, ainda, como fazemos, trazer trecho da decisão de 1o grau do processo que, tramitou em segredo de justiça no Foro Central da Comarca da Capital, com acórdão confirmado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:
“Ora, o conceito de home care, como é de amplo conhecimento na área médica, visa ao atendimento das necessidades de pacientes que precisam de internação hospitalar, mas que apresentem um quadro clínico estável, suficiente a autorizar sua permanência em um ambiente
extra hospitalar, sua casa, mais perto da família.
Desta forma, está claro que se destina à continuidade do tratamento que estava sendo realizado no hospital, e que contava com a cobertura do plano de saúde, com as vantagens de: redução considerável do risco de infecção para a paciente, redução do custo da internação, considerando a transferência do ambiente hospitalar para o domiciliar.
Assim, insere-se no contexto de home care o suporte de profissionais, bem como o fornecimento de medicamentos e materiais necessários para tratamento da paciente.
(…)
No mais, o autor é considerado deficiente, nos termos do artigo 2° da lei n. 13.146/15. Assim, deve haver a disponibilização de recursos, tanto humanos quanto tecnológicos, que garantam atendimento em igualdade de condições com as demais pessoas, bem como proteção
e socorro em quaisquer circunstâncias.
Por fim, o dano moral decorre “in re ipsa” do inadimplemento de obrigação contratada em plano de saúde. Para indenizá-lo, considerando a gravidade do dano e da culpa da ré e ainda a função punitiva e pedagógica da verba, fixo a quantia de R$ 10.000,00.”
Mas, tão além disso, muito além de uma notícia jurídica, quisemos demonstrar o quanto tem de batalha em cada caso; em cada história que carrega êxito em conseguir levar um familiar para casa. Um jovem rapaz.
Não com pouca emoção, recebemos uma foto da mãe com seu jovem filho, com quem, finalmente, ela poderia passar o Natal. Em casa. As luzes da árvore brilhariam dentro do seu lar e não mais fora de sua janela do hospital.
Recebemos também notícias do tratamento do rapaz, com um vídeo com o primeiro sorriso que conseguiu dar. Fora da clínica de retaguarda. Em casa, onde, ainda que, de modo inconsciente, sabia que poderia sorrir. E de onde também, nos faria sorrir, sabendo que as folhas, os papéis, as petições e decisões tinham um significado profundo que aquele sorriso seria capaz de nos explicar.
Rodrigo Lopes e Fernanda Giorno, sócios do Lopes & Giorno Advogados