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Morte do titular do plano de saúde

Morte do titular do plano de saúde

 Em tempos tão difíceis como o de pandemia, tem-se assistido, cada vez mais, à preocupação de diversos consumidores que, além da dor motivada pela perda do familiar, veem-se ilegalmente expulsos do plano de saúde do qual eram dependentes, pela morte do titular.  

Cuida-se de situação que traz angústia aos consumidores, vulneráveis tanto pela situação de vida, quanto pela falta de proteção ao terem conhecimento da rescisão unilateral do plano de saúde, como dependentes que estavam, seja na condição de cônjuge, companheiro ou filho.

Sob a ótica do direito do consumidor, a conduta da operadora do plano de saúde, que rescinde unilateralmente o contrato de saúde do dependente, sem dar o direito de continuar, mesmo caso realizado o devido pagamento, é inadmissível.

De certo que, na análise do contrato de adesão do plano de saúde,  deve – se pautar pela interpretação do artigo 47, Código de Defesa do Consumidor: “As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”

Ainda, nos termos do que leciona Claudia Lima Marques[1], “os contratos de planos e seguro-saúde são contratos cativos de longa duração a envolver por muitos anos um fornecedor e um consumidor, com uma finalidade em comum, assegurar ao consumidor o tratamento e ajudá-lo a suportar os riscos futuros envolvendo a saúde deste, de sua família, dependentes e beneficiários”.

 

Do direito à manutenção do plano de saúde após a morte do titular

Insta frisar que a Lei nº 9656/1998 é de clareza solar ao afirmar o direito de permanência do dependente no plano de saúde outrora titularizado por familiar:

Art. 30.  Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.                    (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001)

 3oEm caso de morte do titular, o direito de permanência é assegurado aos dependentes cobertos pelo plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde, nos termos do disposto neste artigo.

A dicção normativa da legislação em vigor (Lei nº 9.656/1998) é inequívoca, combinando-se o art. 30 caput e seu parágrafo 3º: no caso da morte do titular, os dependentes cobertos pelo plano de saúde têm direito à permanência no plano, mantendo as mesmas condições de cobertura, desde que assumam o pagamento integral.

Sublinha-se que se trata de momento de fragilidade da sociedade, estando-se em um cenário jamais imaginado: uma pandemia, a exigir tratamento eventualmente emergencial, não podendo o dependente ser excluído do plano de saúde, arbitrariamente, quando pode justamente precisar de hospitais adequados. Notadamente quando o consumidor tem intenção de adimplir com as suas mensalidades de modo devido, não podendo ser impedido de permanecer por um capricho unilateral da seguradora.   

Assim, com pilar na Súmula 13 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e, com base nos princípios constitucionais da igualdade, dignidade da pessoa humana, da liberdade, da segurança jurídica e da proteção à entidade familiar, enseja-se o reconhecimento do direito à manutenção do consumidor, nas mesmas condições contratuais em que o consumidor dependente se encontrava antes da morte do titular, sem que haja criação de novos obstáculos, como exigência de carências.

SÚMULA NORMATIVA N° 13/2010 ANS: 1 – O término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo.

Conclusivo que admitir-se a exclusão do dependente do plano de saúde significaria autorizar que este se sub-rogasse numa função legislativa, para escolher qual consumidor permanece ou não como segurado, desobedecendo ao comando legal. Seria permitir o convênio ponderar o que é mais apropriado, sob o ângulo do próprio interesse do plano de saúde, o que é vedado pelo ordenamento jurídico.

De certo que não existe que emergência/urgência maior que a própria manutenção da vida, ainda mais em tempos de pandemia.

Existência de cláusula de remissão não impede a posterior continuidade do dependente no plano de saúde

 Pondera-se que, a existência de cláusula de remissão não impede a posterior continuidade do dependente no plano de saúde.

Especificamente, cláusula de remissão é uma previsão contratual que garante a prestação dos serviços de saúde aos dependentes após a morte do titular, sem que haja a contraprestação de mensalidade. Costuma ter variação de 1 a 5 anos.

É de se destacar que a existência ou não da cláusula de remissão nos contratos de saúde não impede o pleito de continuidade do trato.

Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo, a partir de atuação do nosso escritório

“Frise-se que a hipótese é a do artigo 30, pelo fato de o marido da autora ser empregado da empresa, quando do falecimento. O falecimento, por óbvio, acarretou a rescisão do contrato de trabalho. Qualquer disposição contratual diversa é evidentemente abusiva e, portanto, nula de pleno direito (art. 51, IV, CDC).

Desta forma, se o titular incluiu a autora no plano de saúde plano de saúde então contratado, na condição de “dependente”, forçoso é convir que a morte dele conferiu a ela o direito de optar entre a continuidade do contrato em curso e a celebração de outro.

Vale dizer que o plano de saúde é um contrato de duração continuada, que confere aos segurados a expectativa de contar com a prestação de serviços médicos e hospitalares nos moldes ajustados, conforme se obrigou a seguradora. Não se trata de um ajuste comum de prestação de serviços, mas sim de um contrato com características peculiares, uma vez que celebrado em razão dos cuidados com a vida e a saúde, devendo ser orientado pelo princípio da função social do contrato, da boa-fé e da dignidade da pessoa humana”.

TJSP, Processo 1000858-58.2021.8.26.0008, j. em 3/05/2021

 Inequívoco, assim, que o consumidor dispõe de ferramentas, para que, mesmo com a morte do titular do plano de saúde, possa dar continuidade e permanecer no seu plano de saúde, atuando frontalmente contra condutas abusivas, no desiderato de que estas sejam desestimuladas.

 

Fernanda Giorno de Campos, advogada, pós graduada em Direito Econômico e Setores Regulados pela Fundação Getúlio Vargas, é sócia do Lopes & Giorno Advogados

 

[1] MARQUES, Claudia Lima. Saúde e responsabilidade: seguros e planos de assistência privada. Revista dos Tribunais: 1ª Edição, 1999, página 117.

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